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“Ele foi alguém que estava á procura de algo para se satisfazer. Ele esteve procurando em toda a sua vida. Ele estava procurando, eu acho que, até o momento, o ano em que ele tirou a própria vida. Este era alguém que queria encontrar “o caminho” e, infelizmente, ele nunca encontrou nada que realmente o ajudou.”

-Charles R. Cross sobre Kurt Cobain

Capítulo 1 - All Apologies



Inúmeras vozes gritavam seu nome como um mantra.

Os corpos ali presentes se mexiam, balançavam suas cabeças para lá e para cá.

As luzes iluminavam parcialmente o local, a fumaça pairava pelos cantos.

Por breves momentos, sentiu-se maravilhado. Olhou para platéia à sua frente, e um sorriso discreto formou-se em seus lábios finos.

A fúria, a euforia adolescente, a sensação liberdade: Tudo ali, em frente aos seus olhos azuis.

Eram muitos rostos, ele tinha que admitir. E olhando-os um pouco mais de perto, era capaz de ver aquela mesma tristeza, a mesma raiva contida que havia em si mesmo, nitidamente estampada em cada um deles.

Ele queria poder ter a chance de conhecê-los, um por um.

Queria poder ter a chance de agradecê-los.

E queria poder ter a chance de pedi-los perdão.

O show estava prestes a terminar. Enlouquecidos, os jovens gritavam por mais, até que não houvesse ar em seus pulmões.

Ele deu uma última olhada ao redor. Respirou fundo, e fechou seus olhos por alguns segundos.

Pensou em sua esposa, em sua filha. Pensou em seus amigos, em seus familiares.

No final, ele não passava de um sentimental, ele sabia.

Passou uma das mãos sobre seus cabelos loiros já um pouco grandes, alcançando os ombros, à fim de arrumá-los.

O show tem que continuar.

As primeiras notas de All Apologies retumbavam por todo o espaço. Permitiu-se então, sentir pela última vez o mesmo em que todos ali sentiam: Liberdade.

Sua voz fez-se presente, e logo, tantas outras o acompanhavam.

O que mais ele deveria ser? O que mais ele poderia dizer? O que mais ele poderia escrever?

Deveria ele assumir realmente o papel em que a mídia julgava ser o dele?

Deveria ele dizer a verdade? Dizer que no fim de tudo, eles estavam errados?

Deveria ele escrever toda a sua frustração diante de si próprio e transformá-las em melodia?

O cansaço nunca lhe foi tão grande, e o peso nos ombros nunca lhe incomodou tanto. A dor havia o preenchido de tal forma, que nem ali, no palco, onde anos antes ele dizia ser seu porto seguro, ele não era capaz de esquecê-la.

Ela era grande demais para ser ignorada, profunda demais para ser esquecida.

Ele queria não ser tão desordenado, descontrolado, atrapalhado.

Ele queria apenas um caminho.

Durante todos esses anos, sentia-se como um trem desgovernado, que rapidamente aproximava-se de um precipício.

A todo instante ele tentou o parar.

Nunca conseguiu realmente.

Despediu-se do público, que ainda clamava por si. Agradeceu pela presença, e em seu íntimo, agradeceu por todo aquele carinho no qual ele jamais seria capaz de retribuir.

Percebeu que já havia chegado em casa, quando ouviu um pequeno murmúrio já tão conhecido, e sorriu sem ao menos se dar conta.

Apenas ela causava essa reação nele.

Caminhou calmamente até o berço de madeira, tão simplesmente branco que o entediava. E de lá, retirou seu bem mais precioso.

A única luz em meio à escuridão que era sua vida.

Aconchegou Frances em seus braços magros, e passou suas mãos pálidas pela pele quente e macia de seu rosto.

Um vislumbre de admiração atravessou seus olhos, e pela enésima vez perguntou-se como ela podia ser tão bela e então sorriu, deixando seus dentes brancos e perfeitamente alinhados à mostra.

Sua filha o encarava com curiosidade, observando cada traço que formava seu rosto, e de repente lhe sorriu adoravelmente.

Era naqueles momentos, unicamente, em que a esperança o invadia.

Ele queria melhorar.

Por ela.

Por que ela merecia isso.

Por que ela despertava em si a chama da mudança.

Ele queria ser alguém melhor.

Ele realmente queria.

Naquele momento ele era apenas um pai segurando sua filha em seus braços, e era exatamente isso o que os outros não viam e precisavam ver, pois ali, estava estampada toda a verdade.

Ele era apenas um homem, que assim como todos nós, passou por situações difíceis, fez escolhas erradas, e que a única que realmente almejava era a paz.

E no fim, isso é tudo o que somos: Trens desgovernados, acidentes esperando para acontecer, almas à procura de paz.

Dias depois, aquele trem foi finalmente parado, o peso de seus ombros foi finalmente retirado, e finalmente pôde descascar.

Talvez algum dia, em alguma outra vida, ele encontre seu caminho.

E talvez algum dia, em alguma outra vida, ele terá a chance de ser alguém melhor.

Ele era apenas um anjo incompreendido, que na música encontrou, ainda que por pouco tempo, seu rumo. O que ele não sabia, era que através de sua voz, as pessoas encontravam tudo aquilo o que mais desejavam. O que ele não sabia, era que ele havia feito a revolução, que ele jamais seria esquecido, e que seu sorriso nunca deixaria nossos corações.




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